quinta-feira, 18 de junho de 2015

Cara ou Coroa

Toda moeda tem dois lados, mas só um lado deve ser cara para que o outro seja coroa (o valor). Moedas com duas caras são desprovidas de valores... não são moedas... seriam como fichas que, descartáveis, usamos num brinquedo no parque para tentar a sorte. E também tem outro fato: um lado ser cara e o outro coroa é o que faz existir a moeda... como a escuridão não existe sem a luz, o esquerdo sem o direito... logo, uma pessoa de duas caras é uma pessoa vazia, pobre... que não existe.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

DISTÂNCIAS

       
Com o tempo, nossa memória da infância vai se tornando distante, algumas lembranças já não são mais as mesmas. E assim segue a vida. Pessoas que amamos, e com quem compartilhávamos agradavelmente boa parte de nosso tempo, e também lugares em que adorávamos ir, passar férias, desvendar, se tornam distantes. Se distanciam não por estarem longe, mas porque mudamos. Nós e as pessoas. Nós e os lugares. Mudamos. E nestas mudanças, a distância real surge da possibilidade de nunca mais nos vermos, de não nos darmos um abraço, de não olharmos mais aquele mar. E neste abismo criado na vida entre eu e o outro, entre eu e aquela cidade que vive dentro de mim, está um vazio tão grande que, como num instinto do meu coração, minha consciência repousa na efemeridade das coisas e meu corpo se coloca em cada espaço vazio, longo e silente, abrindo-se em comunhão com o novo. E assim, surge uma nova intimidade, novos sonhos e novos caminhos.  

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Agachado Atrás da Porta



Que seus olhos verdes olhem nos meus negros olhos
E  você não consiga segurar a tremedeira dos seus ossos,
E se contraia, ainda relute, soque os peitos como açoite,
Até seu corpo desistir do exílio e voltar para um braço amigo.
Estirando se perdido,
 o corpo lúgubre não pesa mais nas mãos do amigo.

Deixe rolar uma lágrima,
Como uma gota de orvalho na noite enluarada.
Não há mais corpo, só a alma ferida, atormentada e machucada, dilacerada, enternecida;
Pela vida. Como qualquer pessoa, então perdoa o que tanto lhe magoa.
A ferida, vai estar sempre escrita,bem marcada, nas costelas e virilhas, mas não faça dela a sua vida.
Finda com aquilo que te finda. Aniquila.

Desça desse lugar que não é teu, pelo amor de Deus,
A culpa não é sua da fatalidade que aconteceu.
E as decepções de infância lhe fizeram um homem extraordinário
Então, não vista a armadura para a luta contra seus monstros do armário
Isto é apenas um ato falho...

Vá vestir a bata, e ser simples , e descalços.
Ser forte é lutar contra os internos fatos.

E se digo isto, é porque eu
Não quero mais ouvir você chorando sozinho, agachado atrás da porta.
Agachado atrás da porta.

sábado, 8 de setembro de 2012

Mariana



Se despenteia
E vai subindo a ladeira.
Molejo nas anca
E latão na cabeça.
Um bebê no colo,
Ôtro na barriga,
E mais três em casa
Cum direito a lombriga.
Cantarolando e
De baixo do Sol,
Sandália de dedo,
  vai Mariana.
Êta, Mariana!

sábado, 12 de maio de 2012

A Muda

A muda cresce
Na calada.
Calada ou
Muda.
A vida inteira
Ou cala.

sábado, 31 de março de 2012

Paris

Paris
Notre-Dame de l'amour.
Paris
Ta lumière me conduit.

Nuit
oubliée dans la rue.
Chanson
perdue dans la nuit.

C'est juste une autre chanson,
oublié dans le noir.
Oh, Paris!

(Tradução)
Paris
Nossa Senhora do amor.
Paris
Sua luz me conduz.

Noite
esquecida na rua.
Canção
perdido durante a noite.

É apenas uma outra canção,
Perdida no escuro.
Oh, Paris!

sexta-feira, 9 de março de 2012

CARTA DE UM CONDENADO


Em alguma ilha distante, 09 de Agosto de 1762



Daqui à uma hora, o Sol despontará no horizonte, saindo de dentro do imenso mar que posso, com dificuldade, contemplar através da pequena janela de minha cela. Na verdade a palavra janela é um tanto otimista para designar o pequeno buraco com grossas grades enferrujadas pelo qual a luz do amanhecer entrará. Daqui à uma hora... Um guarda virá. Quem sabe dois? Seria eu merecedor de dois guardas para me tirarem dessas correntes pesadas?  Fardo que carreguei por vinte anos. Isso! Há vinte anos preso, torturado, estuprado por todas as atitudes e palavras mais violentas que um homem pode suportar, condenado à forca. À morte. E depois da condenação, jogado nesta cela como um brinquedo que uma criança abandona e nunca mais lembra que o teve. Porque como vocês sabem, criança tem a memória muito curta. Os adultos também.

Porém, nesta noite, minha última noite como um condenado, avistei a estrela da manhã e ela brilhava mais do que nunca, com toda sua magnitude e beleza. Fitei-a profundamente, e foi quando em um grande fulgor ela me revelou seu grande segredo.

Tolos os que me acorrentam nesta cela. Condenaram-me a algo ao qual já nasci condenado! Nascer é estar condenado à morte! E se sofri, se chorei, se sangrei até meus órgãos se cansarem de lutar e desistirem, foi pela fantasia de que esse sistema que me encadeou tinha o controle sobre a minha vida! Padeci por ilusão!

Então, me liberto! Quebro aqui, o meu ciclo de vida e morte! Esta é a minha carta de alforria! Assinada por mim!

Quando o capataz puxar a alavanca, apenas um corpo se moverá à lei da gravidade. Vai-se apenas uma parte de mim. Estarei vivo nesta carta. Em cada letra, em cada palavra, em cada oração! Oração. E agora que você, por um acaso do destino encontrou-a e leu-a, torno-me vivo dentro de ti! No coração do estágio mais profundo do teu ser. Te liberto! E sempre quando, uma hora antes do Sol iniciar a aurora, você avistar a estrela da manhã, juntos seremos um só! Eu, você, e a estrela! Felizes, em paz e em liberdade!

Obrigado minha outra metade,
                                                                                                           Thomas Harrison